sábado, 16 de abril de 2011

Dificuldades de aprendizagem e relacionamento

Elisabete Condesso
Psicóloga Clínica / Psicoterapeuta / Ludoterapeuta / Formadora





Hoje em dia, as dificuldades de aprendizagem e relacionamento da criança constituem uma das maiores preocupações dos pais, escolas e entidades públicas em geral. Todos os intervenientes no processo educativo da criança, especialmente as escolas, passaram a ter uma maior preocupação de intervenção, visando resolver ou atenuar, sobretudo, os problemas associados ao fracasso escolar.  Esta situação tem que ser obrigatoriamente vista no contexto da nossa sociedade em constante transformação, quer na dinâmica familiar, quer nas mudanças de costumes e valores familiares, e que têm interferido no estilo educativos dos pais, escolas e nas suas relações familiares e interpessoais. É neste cenário que as escolas devem procurar uma maior integração família-escola, e reconhecer que algumas crianças não obtêm desempenho académico satisfatório devido à interferência de variáveis afectivas e comportamentais. Também é de suma importância propor mudanças aos pais, alertando-os quanto à necessidade de haver comunicação e relações interpessoais saudáveis no âmbito familiar para a formação de crianças competentes para a vida pessoal e profissional no futuro.

Há períodos da vida, chamados períodos sensíveis, em que determinadas influências são de maior impacto para o desenvolvimento da criança. O processo inicial de escolarização pode ser considerado um período sensível para a trajectória do desempenho escolar. Os dois maiores desafios da socialização, enfrentados pela criança em idade escolar, consistem em se ajustar às exigências do professor e em responder às expectativas dos colegas. Se a criança falhar nesses desafios, pode ter, como consequência, o risco de fracasso escolar e de rejeição pelos colegas, como ainda o desenvolvimento de outros padrões de comportamentos problemáticos.

O desempenho escolar constitui uma condição de protecção ou de vulnerabilidade da criança e posterior desenvolvimento da mesma. O bom desempenho académico favorece a valorização da criança pelos adultos, bem como promove a superação de dificuldades e o seu empenho em projectos de vida que busquem a auto-realização. Por outro lado, o baixo desempenho escolar acentua as dificuldades e as vivências de sentimentos negativos, acarretando outras dificuldades comportamentais e emocionais e gerando uma sensação de não cumprimento das suas tarefas sociais referentes à escolarização.

Factores associados à competência académica

Estudos diversos comprovaram que os factores associados à competência académica são o género, o nível socioeconómico, os aspectos cognitivos e o desenvolvimento social da criança. Quanto ao género, esses estudos concluíram que as meninas possuíam melhor desempenho académico que os meninos. Os alunos com maior nível socioeconómico possuíam melhores competência académica. No que se refere aos aspectos cognitivos, observaram que alunos de escola particular apresentavam melhor desempenho do que os de escola pública em teste de inteligência (medida pela WISC). Do lado do desenvolvimento social da criança, vários factores articulam-se para produzir o fracasso escolar. Entre tais factores incluem-se as dificuldades nas interacções sociais - um conjunto bem elaborado de habilidades sociais, na idade pré-escolar, está associado a um maior sucesso escolar posterior, ou, em caso contrário, um conjunto inicial pobre dessas mesmas habilidades permite prever dificuldades na adaptação e rendimento escolar.


Competências sociais


A competência social qualifica a capacidade do desempenho social e refere-se à capacidade do indivíduo de organizar pensamentos, sentimentos e acções em função dos seus objectivos e valores, articulando-os às necessidades imediatas do ambiente que o rodeia. Esta capacidade envolve um conjunto de habilidades complexas, incluindo entre outras, as de fazer perguntas, lidar com críticas, seguir regras, solicitar mudanças de comportamento e resolver situações interpessoais conflituosas. As habilidades sociais da criança, mais frequentemente enfatizadas e valorizadas nos estudos internacionais dos últimos anos, podem ser agrupadas em cinco conjuntos de comportamentos: 1. Relação com os companheiros (cumprimentar, elogiar, oferecer ajuda ou assistência) convidar para jogo de interacção), 2. Autocontrolo (controlar o humor, seguir regras, respeitar limites), 3. Habilidades sociais académicas (envolver-se na tarefa realizá-la de forma independente, seguir instruções), 4. Ajustamento (seguir regras e comportar-se de acordo com o esperado), e 5. Asserção (iniciar conversação, aceitar elogios, fazer convites).

A competência social é adquirida por meio do processo de aprendizagem. Desenvolve-se desde a infância - este é considerado como um período crítico para a aprendizagem dessa competência - o que coloca em destaque a necessidade de focalizar a atenção para o desenvolvimento das habilidades sociais de crianças durante esse período. Na aquisição dessas habilidades sociais é importante o papel da rede de relações que inclui a escola, a família e a própria criança, num contexto socioeconómico.

Queixas escolares

É frequente surgirem nessa rede de relações os “problemas escolares” ou “ problemas de comportamento” e de aprendizagem, denominados pelos psicólogos de “queixas escolares”, devido a tais dificuldades ocasionarem solicitações de encaminhamento dos professores e coordenadores pedagógicos para os profissionais de psicologia. Tais dificuldades podem referir-se tanto ao comportamento quanto ao rendimento dos alunos no processo ensino-aprendizagem, tais como dificuldades de aprendizagem, problemas de comportamento, delinquência, ausência e/ou negligência de participação dos pais, etc.

Quando a criança é portadora de um transtorno específico, a forma com que a família reage perante as dificuldades poderá agravar ou ajudar a sua recuperação. Os pais devem ser capazes de promover comportamentos mais adaptativos e maior progresso da criança na aprendizagem escolar ao adoptarem algumas condutas, como organização do ambiente físico e de horários de estudo, estabelecimento de rotinas de vida, apoio às actividades escolares, fornecimento dos recursos e instrumentos para estudar, disponibilizar diversidade de informações, disciplina, comunicação e relacionamento social e familiar.

A família diante das queixas escolares

Pode-se descrever dois padrões antagónicos de família em relação à acção familiar visando o desempenho escolar: a família “pró-saber” e a familiar “anti-saber”. A primeira, a familiar “pró-saber” favorece um clima agradável e estimulante para a busca do conhecimento; a segunda, a família “anti-saber”, promove valores que visam apenas o cumprimento das tarefas e a obtenção de notas. A família “pro-saber” propicia a curiosidade nos seus filhos, desde pequenos, valorizando e criando situações para que eles explorem em seu redor. Na sua rotina e decisões, é uma família que sempre valoriza e respeita as actividades relacionadas com a vida escolar dos filhos. A família “anti-saber”, por sua vez, ou se preocupa excessivamente com as notas dos filhos, valorizando apenas o produto final, ou demonstra, por várias atitudes e decisões, que a busca de conhecimento não é prioridade no contexto familiar.

Outro aspecto importante prende-se com a coesão do grupo familiar. É importante que os pais estabeleçam limites para os filhos e que aja união entre os pais. Os pais precisam conhecer e aceitar abertamente o problema do seu filho, sem generalizar estas dificuldades a todo o comportamento da criança. Devem fornecer um suporte que diminua o efeito do fracasso e para que se desenvolvam outras habilidades, de maneira que a sua imagem pessoal não dependa exclusivamente da escola.

Formação de habilidades sociais para pais

A aquisição das competências sociais ocorre em contexto natural sem recurso a formação formal, isto, no relacionamento entre pais e filhos, irmãos, colegas de escola, amigos, cônjuges. Frequentemente, neste processo de aprendizagem, ocorrem falhas relevantes na aquisição das habilidades sociais. A escola deve assumir um papel mais activo nessa aprendizagem por meio de programas de formação, planeados de forma articulada ou paralela aos objectivos académicos.

A formação de pais pode ser definida como um enfoque para o tratamento dos problemas infantis que utilizará procedimentos por meio dos quais se forma os pais a modificar o comportamento dos seus filhos em casa. A trajectória de actuação em psicologia clínica comportamental demonstra a importância de incluir os pais no atendimento de crianças. É possível verificar a importância da participação dos pais no atendimento das crianças com dificuldades de aprendizagem quanto à eficácia e durabilidade das modificações, ou seja, quando os pais participam activamente, os objectivos terapêuticos são melhor atingidos.

Estudos têm mostrado que, ao se habilitar pais a ensinarem comportamentos adequados e a modificarem comportamentos inadequados dos seus filhos, a família adquire inúmeros benefícios: 1) diminuição da ansiedade e dos sentimentos de frustração, aumento da autoconfiança, diminuição do nível de stress familiar; 2) interacção de modo mais positivo com o filho; 3) melhora na percepção dos pais quanto ao potencial e ao prognóstico do filho; 4) melhora da vida social familiar.

Esta intervenção ao plano formativo pode modelar práticas socialmente habilidosas, no sentido de apoiar o impacto positivo da comunicação, da expressão de afecto e de opiniões, da consistência e da participação de ambos os progenitores na educação dos filhos. os programas de suporte às famílias para desenvolver habilidades sociais podem ser de grande ajuda para atenuar o risco associado a ambientes pouco apoiados e a experiencias de fracasso escolar.

Habilidades sociais dos pais e a sua relação com a aprendizagem dos filhos

Há evidências consistentes de que o comportamento anti-social na adolescência e vida adulta tem como precedentes práticas educativas parentais deficientes quanto à disciplina e à monitorização, fracasso académico e rejeição entre pares. Neste sentido, uma intervenção em prevenção secundária juntamente a pais de crianças com dificuldades de aprendizagem para desenvolver habilidades sociais educativas poderia prevenir possíveis complicações na adolescência e vida adulta dessas crianças.

Fica evidente a necessidade de haver um maior empenho na descrição da elaboração de programas que facilitem aos pais, às escolas e aos órgãos públicos competentes o acesso ao conhecimentos de habilidades educativas eficazes para criar e manter um repertório de comportamentos adequados e ajudar o desenvolvimento de habilidades académicas e sociais nas crianças pode contribuir para ampliar as possibilidades de intervenções comunitárias visando atender às necessidades daqueles que possam usufruir seus benefícios.

1 comentário:

  1. Olá



    Meu nome é Janine Rodrigues . Acabo de lançar meu primeiro livro de conto infantil . Tenho grande interesse pelo assunto crianças com dificuldade de relacionamento e este tema foi uma das coisas que me levou a escrever. No Reino de Pirapora que conta a história de uma menina solitária que impõe uma única forma ao seu mundo e não vê beleza na diversidade. Tenho conversado com alguns pais e alguns me perguntam sobre associações , grupos de apoio que tratam deste assunto . Gostaria de saber se podem me indicar grupos , associações onde estas famílias podem buscar ajuda especializada. A ideia do meu livro é fazer a criança se identificar de alguma forma com a historia e através disso provocar uma discussão sobre o assunto . Muitas vezes o problema existe e a familia não se da conta ou trata o problema como algo normal que ''um dia vai passar '' porem sabemos que quase nunca passa e só causa transtornos maiores no futuro .



    Parabéns pelo trabalho . Segue meu site , caso queiram conhecer um pouco do meu trabalho : www.piraporiando.com



    Abraço,

    ResponderEliminar